5 de novembro de 2010

A nossa vez de fazer esclarecimentos

retirado do "Diário do Minho" de 03/11/2010

O texto que se segue é da responsabilidade dos seus autores, não estando a ele vinculado uma posição da associação Jovem Cooperante Natureza/Cultura.



David Ribeiro Mendes, Arqueólogo
Ricardo Silva, Arqueólogo


Muito se tem escrito e propagado sobre uma hipotética ancestral travessia nas margens do Rio Cávado, na zona hoje conhecida como Ponte do Bico.
O historiador João Gomes assumiu a defesa de um conglomerado de pedras e chamou a si a responsabilidade da descoberta dessa antiga travessia na Ponte do Bico.
Numa primeira instância, tivemos oportunidade de explicar a João Gomes que aquelas pedras não apresentavam evidências arqueológicas e o que era por ele proposto seria inconcebivel do ponto de vista da engenharia e da arquitectura, não havendo, por isso, da nossa parte validação científica.
Além do mais, chamamos a atenção desse investigador para a necessidade de, em caso de dúvida, chamar as entidades competentes, neste caso, o Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Braga e a Extensão Territorial do IGESPAR, pois elas terão recursos humanos competentes para avaliar a situação.
Parece que o autor dessa proposta entendeu esta nossa postura de forma ofensiva e rubricou no Diário do Minho, depois de nos ter dito que não o faria novamente para alimentar novelas jornalísticas, um novo artigo de opinião sobre o mesmo assunto.

Sobre este artigo, fazemos as seguintes considerações:

  1. O autor diz que acredita numa travessia entre as margens do Cávado, através da Ponte do Vau do Bico. Esta afirmação prova, desde logo que pode ter havido travessia, mas não em ponte, porque VAU significa "sítio pouco fundo de um rio, por onde se pode passar a pé", logo, não havia necessidade de construir uma estrutura tão pesada como uma ponte.
  2. Já que o mesmo investigador tenta comprovar a existência de uma ponte através da toponímia, então tem de ter em atenção o próprio nome VAU e os seu significado, relembrando nós que o topónimo "Ponte" está situado bem mais a montante do que João Gomes quer fazer defender.
  3. O facto de o autor da proposta definir o amontoado de pedras como reminiscência de uma obra de construção de linha férrea, e mesmo assim chamou àquilo Ruínas da Antiga Ponte, só mostra o carácter abusivo e pouco sério desta sua proposta. Afinal, foi mesmo um engodo para os jornalistas.
  4. Felicitamos a iniciativa da deslocação de outros profissionais de arqueologia, ao local, pois é sinal de que fomos ouvidos quando indicamos que aquele sítio, em caso de dúvida, deveria ser analisado pelo Gabinete de Arqueologia da CMB e pelo IGESPAR. É que para tratar de matérias sensíveis há gente qualificada e competente para o efeito, não podendo haver posturas de Indiana Jones de fim de semana;
  5. O anterior texto, como o presente, são assinados por dois arqueólogos, devidamente (a)creditados para exercer esta profissão, pelo que, nesta circunstância, fizemos questão de vincular a nossa ideia profissional e não associativa. Mas já que o autor refere a JovemCoop, reiteramos a ideia de que a protecção do património pode ser feito por qualquer cidadão interessado. Se o investigador acha que a JovemCoop é uma entidade que conferirá mais valia à protecção da calçada, alegadamente, romana, congratulamo-nos com esse elogio, mas assumimos que não podemos sair em defesa de sítios que não conhecemos o seu real valor arqueológico, porque simplesmente o nosso trabalho é voluntário e temos escassez de recursos humanos. Agora, se o investigador acha precioso o nosso contributo, então porque não nos contactou atempadamente e nos deu a conhecer esta situação? E se valoriza o nosso contributo para a defesa do património, porque é que o autor do texto não se propôs como sócio da JovemCoop?
  6. Temos todo o interesse que se descubra património, mas não achamos benéfico "inventar" património, sobre o risco de acontecer como a fábula do "Pedro e do Lobo"...quando houver, de facto, património em risco, corremos o risco de não sermos levados a sério!
  7. A arqueologia é uma profissão séria, e para tal é necessário adquirir competências académicas para a exercer. Quem gosta de arqueologia não pode, apenas, desempenha-la sem ter competências para tal, por isso, ou chama profissionais para ajudar a fazer avaliações ou então deve voltar à universidade e licenciar-se em arqueologia.

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